A paulistana Lela Brandão, de 31 anos, é arquiteta por formação, mas trabalhou pouco na área, porque logo enveredou para as artes plásticas. Em 2018, ela se tornou muralista e começou a publicar suas obras de teor feminista nas redes sociais. Por lá, formou uma comunidade ativa. “As pessoas tinham interesse pelo o que eu fazia e pensava. As seguidoras reparavam até nas minhas roupas e perguntavam de onde eram”, diz.
Na época, Lela ainda não se sentia confortável para falar sobre o assunto, por causa da relação complicada que mantinha com o próprio corpo. Com um histórico de distúrbios alimentares, ela penava para encontrar peças que a vestissem adequadamente. “Eu buscava por roupas que não entregassem se eu tivesse engordado ou emagrecido. Era difícil. Foi quando comecei a sonhar com um lugar onde as mulheres soubessem que tudo ali foi pensado para servir, respeitar e acolher elas.”
Algumas peças da coleção fixa da Lela Brandão Co.
Foto: Divulgação
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A transição oficial das artes para a moda aconteceu em 2019. Lela começou a vender camisetas com estampas autorais e esgotavam rapidamente. Em 2020, durante a pandemia, ela e o marido, o músico Viktor Murer, decidiram usar o dinheiro de uma viagem cancelada para fundar a Lela Brandão Co. Viktor já era sócio de uma estamparia voltada para camisetas de bandas de rock e tinha experiência na produção. A primeira coleção oficial da etiqueta chegou em setembro daquele ano, meses após Lela compartilhar nas redes o passo a passo de criar uma marca do zero.
Naquela altura, as seguidoras já estavam familiarizadas com o projeto e bastante interessadas nos produtos. O drop de tops e calças caneladas e superconfortáveis esgotou ainda na pré-venda. Por causa do sucesso, o segundo lançamento, que estava previsto para dezembro, foi antecipado.
Lela Brandão usando as peças de sua marca.
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Desde então, a Lela Brandão Co. lança cerca de uma coleção por mês com a ideia de conforto guiando a produção. Moletons quentinhos, roupas de academia, calças de alfaiataria, camisas oversized, biquínis e camisetões com estampas bem-humoradas formam um acervo fixo. A cada coleção, a resposta do público define o que entrará para o leque de itens perenes. “Como somos uma marca atemporal e não trabalhamos muito com tendência, apostamos nos best-sellers que já foram validados com a comunidade, replicando e repondo o estoque com novas cores ou pequenas alterações, se necessário.”
Um dos grandes diferenciais do empreendimento é encontrar soluções para acompanhar as mudanças naturais do corpo feminino, como o inchaço durante o período menstrual. As blusas de poliamida dispensam o uso do sutiã sem deixar de sustentar bem os seios. Já as calças jeans contam com elásticos internos no cós, inspirados nos ajustes de roupas infantis, para se adaptar ao vai e vêm das medidas. “Quando eu sofria com distúrbios alimentares, ficava obcecada para caber em uma calça específica. Vestir algo que se adapta a você, e não o contrário, é libertador. Uma mulher confortável em si é uma revolução.”
A campanha da coleção em parceria com os influenciadores Nanaths e Lusca.
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O ticket médio dos produtos, que gira em torno de R$230, também é um ponto-chave. Itens especiais, feitos em menor escala, chegam a até R$500 e são produzidos em menor quantidade. “Não adianta ter uma margem de lucro que nos distancie de nossas consumidoras. Já deixamos de lançar produtos incríveis porque o preço final não seria acessível”, explica. Com o tempo, foi preciso ajustar o estoque. “As clientes reclamavam que tudo se esgotava rápido. Reestruturamos a operação. A comunidade sempre esteve no centro das decisões.”
A marca também investe em colaborações, como a inspirada em obras da artista Tarsila do Amaral, em março de 2024, e a com o casal de criadores de conteúdo Lusca e Nanaths, que produz vídeos de moda, beleza e entretenimento. Para 2025, estão previstas duas parcerias internacionais.
Lela Brandão na campanha da coleção com Tarsila do Amaral.
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Em números
A Lela Brandão Co. vai completar cinco anos em setembro de 2025 e, nesse período, expandiu-se em criação e comunicação. A estamparia, que deu início à operação, hoje é uma fábrica que atende outras casas, como as produções nacionais da Ed Hardy e da Kappa. No começo, Lela desenhava os itens e enviava as ideias para uma modelista terceirizada. Agora, há uma estilista própria no time.
No primeiro ano, o casal alcançou R$ 400 mil em vendas. Em 2021, inaugurou duas lojas físicas – uma no Shopping Morumbi (fechada pela incompatibilidade com a rotina do shopping) e outra na Vila Madalena, (que vive lotada aos finais de semana). Em 2024, foram registrados R$10 milhões em produtos vendidos. Para 2025, a projeção é crescer 30%. “Crescer quando se é pequeno é uma coisa. Agora, quando você já é maior, dobrar de tamanho é muito mais difícil.”
Hoje, a equipe conta com cerca de 100 pessoas, entre costureiras, modelistas, profissionais de marketing e atendimento. E, claro, uma social listener dedicada a ler e ouvir os comentários das seguidoras e compradoras. “Se a comunidade pede por uma saia plissada, a gente cria. Observamos os feedbacks positivos e negativos e usamos isso para construir uma marca onde as mulheres são ouvidas.”
Lela Brandão gravando seu podcast Gostosas também choram.
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